Desequilíbrios na Antártida impactam no clima e ameaçam biodiversidade marinha até no Brasil
A cobertura vegetal do continente antártico apresentou um crescimento acelerado nas últimas décadas, evidenciando desequilíbrios em curso no polo sul, que, até então, havia sido menos afetado pelas mudanças climáticas. O que ocorre na Antártida repercute em todo o planeta, especialmente na regulação do clima e na preservação da biodiversidade marinha.
Imagens de satélite revelam que as superfícies rochosas da península antártica, localizada ao norte, tornaram-se 14 vezes mais verdes nos últimos 35 anos, resultado da multiplicação de musgos e líquens, que são tipos de fungos vegetais. O aumento das áreas verdes indica um aquecimento significativo da temperatura na região nos últimos 60 anos. As zonas mais expostas podem registrar um aumento de 0,34 °C por década até o final deste século. Essas conclusões foram publicadas por cientistas da Universidade de Exeter na revista científica britânica Nature Geoscience.
A proteção da Antártida, referida como “Amazônia branca” pelo ativista ambiental José Truda Palazzo, é uma questão de preocupação para defensores de espécies marinhas, como baleias e focas, que enfrentam os impactos da crise climática. A redução das emissões de gases de efeito estufa é considerada essencial para conter o aquecimento global e o derretimento do gelo na região. Palazzo ressalta que a biodiversidade marinha desempenha um papel crucial no equilíbrio climático da Terra.
A próxima reunião da Convenção para os Recursos Vivos Marinhos Antárticos abordará questões prioritárias relacionadas à preservação dos ecossistemas, incluindo a criação de novas áreas protegidas na península antártica e a regulação da pesca do krill, crustáceo fundamental na cadeia alimentar da região e que contribui para a absorção de dióxido de carbono (CO₂).
O krill antártico, cujos excrementos absorvem quantidades significativas de carbono, é uma base crucial da pirâmide alimentar no polo sul. No entanto, as nações da Rússia e China têm dificultado o progresso em relação a essas pautas. Enquanto a frota pesqueira chinesa se beneficia da expansão da pesca antártica, especialmente do krill, a China se mostra mais disposta ao diálogo em comparação com a Rússia. Palazzo espera que o Brasil atue junto a seus representantes políticos, incluindo o presidente Lula, para promover uma agenda climática que priorize a conservação da Antártida, estabelecendo parcerias com esses países.
Os impactos das mudanças climáticas também se manifestam pela diminuição das placas de gelo. A Antártida, que historicamente era mais protegida das alterações climáticas do que o Ártico, tem enfrentado, nos últimos anos, a redução de sua cobertura de gelo. Em 2023, as medições indicaram uma diminuição alarmante, com 3 milhões de quilômetros quadrados de gelo a menos durante o inverno austral.
Os pesquisadores observam que existem interações complexas entre a atmosfera, o gelo e o oceano, que evoluem simultaneamente. Martin Vancoppenolle, do Centro Nacional de Pesquisas Científicas, sugere que as mudanças na estrutura vertical dos oceanos podem estar contribuindo para a transferência de calor em direção ao gelo, um fenômeno crescente desde 2016. As placas de gelo estão se tornando mais finas, o que resulta em um derretimento mais intenso e precoce.
As placas de gelo têm um papel vital no balanço energético do planeta, refletindo a radiação solar e contribuindo para a limitação do aquecimento global. A circulação oceânica, um fator chave no clima terrestre, depende dos ciclos de formação e derretimento do gelo. No entanto, a comunidade científica ainda carece de dados suficientes para atribuir a recente redução das placas de gelo exclusivamente às mudanças climáticas, já que essa extensão sempre apresentou variabilidade.
A reversibilidade do derretimento do gelo permanece uma questão em debate. Vancoppenolle destaca que, se os níveis de CO₂ na atmosfera forem reduzidos a patamares anteriores, é possível que o gelo se recupere rapidamente, pois possui uma estrutura relativamente jovem. Essa característica contrasta com as calotas polares, que demandam milhares de anos para se formarem. A proteção das placas de gelo é essencial para evitar a elevação do nível do mar, que resulta do derretimento das calotas polares formadas por água doce.
*Com informações da RFI.
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Redação do Jornal Grande Bahia